7 de novembro de 2011

Gaian e o Exército de Anjos - parte 1: A Autópsia

O dia está chegando ao fim para Doutora Isabela Meyer, conhecida como a melhor da cidade em sua atividade. Ela é tanatologista*, profissional que examina cadáveres em busca das causas de suas mortes. Para os leigos, ela era apenas a “médica legista”.

Hoje o dia tinha sido atípico, poucos casos para serem resolvidos. Normalmente a correria era grande, muito tumulto se passa pelo I.M.L* de Osasco onde ela trabalha - em parte por sua fama de eficiência, em outra pelo grande número de acidentes trágicos que acontecem diariamente. Raramente aparecem casos simples que logo são encaminhados para outros médicos que também atuam em sua área.

Já se preparava para finalizar o relatório diário, quando o sinal soou. Era o aviso de mais um corpo chegando para uma autópsia, provavelmente teria que alterar seus planos de ir mais cedo para junto de sua família. De sua mesa, pode avistar os dois agentes funerários que traziam o corpo, embalado no característico saco preto, pelo corredor sobre  uma maca móvel. Largaram a maca no meio da sala e antes de saírem, avisaram-na que logo mais viria um representante da Segurança Nacional, para falar com ela, a respeito do corpo recém chegado.

Aquilo era novo. Ela se perguntou o que estaria por vir... Por que haveria necessidade da Segurança Nacional estar presente? Pelo visto ela teria que esperar para saber. Para não perder tempo, tratou de descobrir o corpo, e eis a primeira surpresa. Ele estava absolutamente intacto, nem sequer um arranhão visível, revirou o defunto a procura de alguma marca ou algo do tipo, mas não encontrou nada. O corpo pertencia a um homem de aparência física muito marcante, músculos bem definidos, mas sem deixar de ser elegante. Era muito estranho, Isabela estava acostumada a receber apenas casos complicados em que fosse necessário esclarecer os detalhes para policiais e outras autoridades, mas nunca fora um caso de nível nacional.

Dando início à autópsia ela começou por abrir o abdômen, para verificar seus órgãos vitais, também ali não encontrou nada que pudesse atestar o óbito. Não encontrou ferimentos e nem mesmo sinais de hemorragias ou a falência de algum órgão. As pessoas morrem por inúmeros motivos, para não haver sinais explícitos, sugeria-se morte por alguma doença ou envenenamento. Casos assim até eram normais, mas não para Doutora Meyer, para ela apenas os casos mais complicados eram encaminhados, casos de mutilação, esfaqueamento, alvejados á bala, entre muitos outros.

Para Isabela receber um corpo intacto, sem ferimento externo visível já era estranho demais, descobrir que ele também não tinha nenhum trauma interno era no mínimo estranho, e saber que, além disso, tudo estava á caminho a Segurança Nacional? Ela encarou, com a testa franzida em sinal de frustração, o homem morto com o esterno aberto na mesa. Como se buscasse nele as respostas para suas inúmeras interrogações.

Já se passara um bom tempo, e sem obter sucesso Isabela deixou-se ficar ali cismando, minutos depois julgou ter ouvido alguns passos no saguão de entrada e foi ao encontro, esperando que fosse a visita que aguardava. Chegando a entrada da sala espiou pela porta e não viu ninguém, confusa se virou para voltar ao trabalho e foi então que á viu.

A mulher esbelta, não muito alta, mas mais do que ela, se aproximou da maca e, como se fosse à coisa mais normal do mundo, ergueu o corpo estendido sobre ela, agarrando-o junto ao peito.  Para tanto ela precisaria de mais força do que aparentava ter. Como foi que ela entrou ali sem que Isabela percebesse? Mesmo impactada com aquela visão nada convencional ela encontrou sua voz.

- Largue-o imediatamente - gritou alto com a invasora, esperando impressioná-la com seu tom de comando.
A estranha virou-se para ela, aferrando-se ainda mais ao corpo do desconhecido, encarando-a.

- Eu não posso – sua voz melancólica acompanhada de um olhar profundamente dolorido desnorteou a médica.

Isabela não entendeu nada, menos ainda sua própria falta de reação, sentia como se a mulher chorasse por dentro, a tristeza estampada naquele semblante bonito era dilacerante. Provavelmente o motivo era a morte daquele homem que agora ela carregava para fora do laboratório sem o menor esforço.

Somente alguns segundos depois da saída da seqüestradora, foi que Isabela deu-se conta que não tentará impedi-la, então correu para o telefone, só para descobrir que este estava mudo. Correu para a entrada para ver se alcançava a mulher, não sabia exatamente o que faria caso a encontrasse, mas não a deixaria escapar facilmente, porém, surpresa viu que o saguão estava completamente vazio.


(Redação: Kátia Alexandre)


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Tanatologista*  – É o médico especialista em Tanatologia, que é a parte da medicina legal que se ocupa da morte e dos problemas médico-legais com ela relacionados. É uma palavra de origem grega: Tanathos - o deus da morte e Logia - ciência.
I.M.L* – Sigla para Instituto Médico Legal.


2 comentários:

  1. Sempre gostei e adimirei os teus textos, você sabe...Desde aquela época do trabalho, da primeira carta que você escreveu pra Fê, lembra? Todo sucesso do mundo pra você !

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  2. Adriano
    Maravilhoso esse conto li todas as 3 partes.
    Muito bom.Parabéns

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